sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Miriam Leitão e a garupa tucana nos números da pobreza

Em sua coluna do dia 14 de Julho de 2010 entitulada Os pobres, Miriam Leitão defende a tese de que os “fatos mostram que há uma continuidade no processo de redução da pobreza brasileira nos últimos 17 anos”, e que o fenômeno não deveria ser atribuído a um governo apenas. No rodapé da coluna ela publica o gráfico abaixo e cita como fonte Ricardo Paes de Barros que, segundo nos diz em sua coluna, é considerado o maior especialista brasileiro em pobreza.

Vamos ao gráfico. É possível notar que houve um primeiro grande momento de queda que se deu no final do governo Itamar em função do Plano Real que Miriam atribui, acertadamente, à queda da inflação promovida pelo plano de estabilização econômica elaborado pela equipe de Fernando Henrique Cardoso quando este era Ministro da Fazenda de Itamar Franco. À partir desse ponto começa o truque. Miriam desenvolve sua tese a partir da premissa de que não haveria qualquer diferença entre o FHC Ministro e o FHC Príncipe assim como não há diferença entre as idéias do sociólogo e as do político:“Para que a conta fique correta, não se pode registrar a partir de 1995 mas de 1993 quando se pega o que havia antes do Plano Real.” Tudo bem.

Porém, a diferença entre o Ministro e o Príncipe ficará clara a partir da análise dos dados do gráfico que vamos fazer a seguir. Miriam, entretanto, continua em sua cruzada defendendo o seu Guia: “O percentual de pobres e de extremamente pobres sai de 47% e vai para 38,6%, e lá fica em torno desse número até o fim do governo Fernando Henrique. Em 2003 há uma pequena elevação para 39,4% e começa um novo período de queda, desta vez constante, até chegar a 25,3% em 2008.”

A análise e o discurso de Miriam tentam dar a impressão de que Fernando Henrique Cardoso depois de ter promovido significativa diminuição da pobreza enquanto Ministro da Fazenda de Itamar viabilizou um período de estabilidade e foi muito bem sucedido em impedir que o número de pobres voltasse a subir já que ela minimiza a pequena e insignificante elevação desse número ao final de seu segundo mandato e muito menos tece qualquer comentário que esclareça os motivos que levaram ao aumento mencionado. Miriam não poderia estar mais longe da verdade!

Não podemos nos esquecer de que estamos falando em valores percentuais e que esses são números relativos que não podem ser devidamente analisados sem que se leve em consideração a variação da grandeza com a qual eles se relacionam: no caso em questão, a população brasileira.

E é aí que a Leitão torce o rabo. Não dá para entender como que, mesmo amparada pelo maior especialista em pobreza do país, Miriam possa ter se esquecido de que, segundo números do IBGE, entre 1995 e 2002, a população brasileira cresceu 11.6%. Ora, não é necessário ser um doutor em economia para concluir o que acontece quando a população cresce 11.6% e o percentual dos pobres e extremamente pobres se mantêm praticamente inalterado... vai dois... noves fora... voilá! Houve, na verdade, um aumento real do número de pobres, o que coloca por terra a tese claramente tendenciosa da colunista sobre a continuidade dos esforços de redução da pobreza. Mas não para por aí não. Intrigado pelos números fiquei curioso em saber o impacto real desses percentuais e fui buscar no site do IBGE os números relativos ao crescimento da população. Sinceramente, fiquei estarrecido com o resultado quando coloquei lado a lado o crescimento da população brasileira com o número absoluto de habitantes vivendo na condição de pobreza em nosso país. Esses números foram facilmente conseguidos à partir de uma regra de três simples usando os dados demográficos do IBGE e as percentagens fornecidas pela senhora Leitão. Veja os resultados da pesquisa no gráfico abaixo:
47% de 149.2 milhões = 71.2 milhões;
38.6% de 155.7 milhões = 60.1 milhões;
38,3% de 171.6 milhões = 65.7 milhões;
39.4% de 176.8 milhões = 69.6 milhões;
25.3% de 189,6 milhões = 47.9 milhões;

Aquela “pequena elevação” do final do governo simplesmente contribuiu para trazer o número de pessoas vivendo em condição de pobreza de volta a patamares pré-plano Real. Ou seja, se Fernando Henrique, como Ministro idealizador do plano Real, tirou 11 milhões de pessoas da pobreza, como Príncipe fez o favor de retorná-las à sua antiga condição quase que integralmente. E sua serva, a senhora Leitão, auxiliada pelo maior especialista em pobreza do país usam e abusam da matemática para distorcer os fatos e convencer seus leitores de que não houve um hiato significativo entre os dois momentos de redução da pobreza por eles citados e que tanto os tucanos como os petistas devem ser parabenizados pelos seus esforços tão bem sucedidos nessa área. Isso é que eu chamo de garupa!

Então Miriam, para que a conta fique correta vamos combinar o seguinte: Fernando Henrique Cardoso tirou 71.2 - 60.1 = 11.1 milhões de brasileiros da miséria com o Plano Real. Depois durante os seus dois mandatos levou 69.6 - 60.1 = 9.5 milhões de brasileiros de volta à condição de pobreza. O que faz com que a contribuição do PSDB ao processo de redução da pobreza no Brasil fique em 11.1 - 9.5 = 1.6 milhões de brasileiros. Durante os 8 anos de governo Lula a população cresceu 10.1% entre 2003 e 2009 — os números de 2010 ainda não se encontram disponíveis — e 69.6 - 47.9 = 21.7 milhões de brasileiros deixaram de viver na condição de pobreza. Ao que parece não é a Dilma que sai por aí andando de garupa!

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Conversa com Jabor

Recebi ontem via e mail uma mensagem encaminhada como corrente que me motivou a escrever esse post. Era um comentário de uma repórter do Estadão sobre a censura desnecessária de um texto de Arnaldo Jabor datado de 2006. Seguem a íntegra do texto e minhas considerações sobre ele.


TSE retira comentário do Arnaldo Jabor do Site da CBN- Será que mesmo assim as pessoas votam nesta corja?

Leia o comentário de Dora Kramer, Estadão de Domingo:

A decisão do TSE que determinou a retirada do comentário de Arnaldo Jabor do site da CBN, a pedido do presidente Lula até pode ter amparo na legislação eleitoral, mas fere o preceito constitucional da liberdade de imprensa. Não deixem de ler e reler o texto abaixo e passem adiante!

A VERDADE ESTÁ NA CARA, MAS NÃO SE IMPÕE.
Arnaldo Jabor

O que foi que nos aconteceu? No Brasil, estamos diante de acontecimentos inexplicáveis, ou melhor, 'explicáveis' demais. Toda a verdade já foi descoberta, todos os crimes provados, todas as mentiras percebidas. Será mesmo? O que terá acontecido? Tudo já aconteceu e nada acontece. Os culpados estão catalogados, fichados, e nada rola. A verdade está na cara, mas a verdade não se impõe. Isto é uma situação inédita na História brasileira!!!!!!! Claro que a mentira sempre foi a base do sistema político, infiltrada no labirinto das oligarquias, mas nunca a verdade foi tão límpida à nossa frente e, no entanto, tão inútil, impotente, desfigurada!!!!!!!!


Concordo plenamente. Basta uma ida ao site do IBGE para se começar a entender quem está por trás desse processo de desfiguração da verdade

JABOR — Os fatos reais: com a eleição de Lula, uma quadrilha se enfiou no governo e desviou bilhões de dinheiro público para tomar o Estado e ficar no poder 20 anos!!!!

Pois é, vamos aos fatos...
“uma quadrilha se enfiou no governo”
Acho que a expressão “se enfiar” ocupa um espaço semântico que entra em conflito direto com o da idéia de ter sido eleito democraticamente. Esse discurso busca, com isso, sugerir que a chegada ao poder não teria se dado de maneira legítima o que o caracterizaria, no mínimo, como falso. Nunca como fato.

Quem desviou dinheiro público para comprar votos, tomar o Estado e permanecer no poder não foi o PT mas o senhor Fernando Henrique Cardoso. Quem queimou dinheiro público para manter as aparências de suas políticas econômicas e ser reeleito não foi o PT mas o senhor Fernando Henrique Cardoso.

Mesmo tendo sido eleito para administrar o Patrimônio público da melhor maneira possível, quem foi intencionalmente negligente e, inclusive, com a ajuda da mídia, promoveu uma campanha de desmoralização da capacidade administrativa do Estado de modo a desviar os lucros advindos da operação das empresas públicas estratégicas para os bolsos de alguns poucos grupos privados em detrimento dos benefícios que poderiam trazer para a grande maioria da população brasileira não foi o PT, mas sim o senhor Fernando Henrique Cardoso. Que saudade da quadrilha que, ao invés de assumir responsabilidade pela administração do patrimônio público e trabalhar para torná-la mais eficiente, preferia vendê-lo a preços muito abaixo de seu valor de mercado de modo a maximizar a rentabilidade do negócio para seus futuros compradores. Seria como contratar alguém para administrar sua empresa e depois de alguns meses essa pessoa, formada na Sorbonne e muita capacitada, chega para você e diz: Olha não vai dar para fazer o que você está me pagando para fazer e que eu disse que faria, mas tem um jeito da gente resolver esse problema. Que tal você vender sua empresa baratinho para atrair mais compradores? Você daria um bônus à esse gerente genial ou o demitiria e o substituiria por alguém com um pouco mais de compromisso com sua empresa? Pois é...

Passemos então ao fato sobre ”Ficar no poder 20 anos...“ Aliás, os tucanos tem se perpetuado no poder em São Paulo e isso nunca é visto como um fator de risco à democracia. Como é que isso pode ser considerado fato ou mesmo real? Fato é que Lula governou por 8 anos e ao invés de orquestrar um mensalão para mudar a Constituição no sentido de permitir à ele um terceiro mandato, prefere agir dentro da constitucionalidade e colocar sua energia em eleger o seu sucessor por que tem consciência de que os resultados de seu governo lhe rendem dividendos políticos muito mais vultosos e legítimos do que o risco de um tapetão ao estilo tucano renderia. O que a mídia conservadora tucana não entende é que Lula não precisa do tapetão que eles precisaram para se manter no poder. O tapetão só se faz necessário quando não há resultados, ou quando não se pode mais mascarar os resultados negativos das políticas implementadas.

Sempre me pergunto por que é que a nossa mídia não constrói o mesmo tipo de discurso dispensado à Lula quando analisa a situação da Colômbia, ou mesmo do Estado de São Paulo. Na Colômbia, mesmo depois de tentar um golpe para viabilizar seu terceiro mandato que acabou sendo considerado ilegal pela Corte Suprema daquele país, Uribe conseguiu eleger o seu sucessor. Mas a vitória do sucessor de Uribe é uma vitória da Liberdade e não uma ameaça à democracia. Da mesma forma, a eleição de membros do tucanato ao cargo de governador de São Paulo, que acontece sistematicamente desde 1995 quando Mario Covas foi eleito, também nunca é vista como ameaça à democracia, mas sim como a vitória de uma escolha inteligente, pragmática e de extremo bom senso dos paulistas. Então por que haveria de se acusar o PT de autoritarismo e caracterizá-lo como uma ameaça à democracia caso consigam eleger sucessor atrás de sucessor por falta de uma oposição que realmente se proponha a se comprometer com ideais dos quais o PT eventualmente tenha se desvinculado? Isso não significaria o fim da democracia, é apenas um reflexo da inabilidade dos demais partidos políticos em encontrar ressonância popular para as propostas que apresentam ou da incopetência dos setores mais conservadores da sociedade brasileira em se adaptar ao novo cenário político insistindo em manter o caráter feudal que sempre caracterizou sua forma de perceber o Brasil e a maneira como este se insere no mundo. Alternância de poder só é um predicado fundamental da democracia quando seus defensores não se encontram no poder. Fernando Henrique Cardoso certamente não acreditava em alternância do poder quando desviou todo aquele dinheiro para comprar os votos necessários à sua reeleição.

JABOR — Os culpados são todos conhecidos, tudo está decifrado, os cheques assinados, as contas no estrangeiro, os tapes, as provas irrefutáveis, mas o governo psicopata de Lula nega e ignora tudo !!!!! Questionado ou flagrado, o psicopata não se responsabiliza por suas ações. Sempre se acha inocente ou vítima do mundo, do qual tem de se vingar. O outro não existe para ele e não sente nem remorso nem vergonha do que faz!!!!! Mente compulsivamente, acreditando na própria mentira, para conseguir poder. Este governo é psicopata!!! Seus membros riem da verdade, viram-lhe as costas, passam-lhe a mão nas nádegas. A verdade se encolhe, humilhada, num canto.

E o pior é que o Lula, amparado em sua imagem de 'povo', consegue transformar a Razão em vilã, as provas contra ele em acusações 'falsas', sua condição de cúmplice e Comandante em 'vítima'!!!!! E a população ignorante engole tudo.. Como é possível isso?


Isso é o que gostariam de acreditar os meios de comunicação para o qual escreve o senhor Jabor. Corrupção não se manifesta somente nos crimes de desvio de dinheiro público escondido em cuecas, panetones e afins. A corrupção também se expressa na adoção de políticas públicas subservientes e dependentes que beneficiam uma parcela ínfima da população de um país negando à grande maioria de seu povo as condições mais básicas para o exercício da cidadania. A corrupção também se manifesta em políticas públicas que refletem uma total falta de sensibilidade quanto às prioridades de uma sociedade. Por que ninguém critica o “desvio” de tanto dinheiro público para a construção de estádios de futebol de última geração para a Copa do mundo? Precisamos muito mais de escolas e hospitais do que de arenas esportivas supermodernas e caras. Os governos deveriam propor que se construíssem esses novos estádios tendo em mente sua utilização posterior ao evento assim como Darci Ribeiro sugeriu que se fizesse com o projeto do Sambódromo: transformá-lo em salas de aula durante o resto do ano quando não fosse utilizado como a passarela do Samba. Isso seria uma forma criativa de amenizar esse gasto absurdo do governo muito bem visto pela mídia que veste a camisa verde amarela somente durante o seu delírio nacionalista bissexto: a Copa do Mundo.

A imagem de povo de Lula não é uma criação marketológica como o são o nacionalismo da Globo ou o novo nome do PFL de Botox — Democratas — que agoniza seus últimos suspiros de viabilidade política tentando enganar o povo com uma nova imagem que tem por objetivo distanciar o partido de seu passado como colaborador da ditadura. A imagem de povo do Lula foi consolidada por uma série de escolhas que surtiram efeitos, realmente, nunca antes vistos na história desse país. As nossas reservas internacionais representam hoje uma parcela maior do PIB do que nossa dívida externa bruta o que permitiu ao Brasil sair da condição paralisante de devedor e se tornar credor internacional. Nos áureos tempos de FHC, a dívida chegou a representar 41,8% do PIB quando o glorioso real atingiu sua maior desvalorização ao final de seu segundo mandato. Em 1997, depois de comprar os votos necessários para alterar a Constituição e permitir sua reeleição, FHC por razões meramente eleitoreiras e egoístas, implementou uma verdadeira liquidação de nossas reservas internacionais a fim de manter artificialmente a estabilidade da nova moeda.

Pois é, os tucanos paulistas, que se vangloriam de sua modernidade administrativa, fizeram, no final do século 20, o mesmo que fizeram seus antepassados com a política de valorização do café durante a República Velha lá no início do mesmo século. A única diferença é que durante os anos 20 queimava-se o café e em 97 queimou-se dólares. Demonstraram, contudo, o mesmo desrespeito ao patrimônio público que foi, e ao que parece, continuou sendo visto apenas como uma ferramenta de capitalização do patrimônio privado daqueles que herdaram o privilégio de gerenciar o patrimônio público. Comportando-se como piratas saqueadores não pensaram duas vezes diante da possibilidade de sacrificar o Tesouro em benefício próprio e de seus pares.

Mas moeda super desvalorizada não é problema por que todos os especialistas da grande mídia sempre afirmam que a desvalorização da moeda é, na verdade, uma coisa boa para a economia brasileira pois beneficiam o setor exportador historicamente consolidado como o motor da nossa economia. Então, se hoje você esperneia por causa dos 37% do PIB de carga tributária, que quando comparado com a carga tributária da grande maioria dos países desenvolvidos do mundo não representa uma percentagem tão absurda como tenta transparecer a grande mídia, pergunte-se por que você nunca se indignou com o fato de ter que pagar quase a metade da riqueza que o País produzia em serviços da dívida externa.

E é aí que entra o segundo grande legado de Lula. O fortalecimento do mercado interno e o impacto significativo que isso teve na redução da vulnerabilidade externa da nossa economia. Permitiu-nos usar mais da nossa riqueza em benefício próprio ao invés de encher o bolso dos especuladores financeiros internacionais de dinheiro fácil. Essa libertação permitiu um avanço ainda mais ousado e urgente de políticas como o PAC, o Programa de Aceleração do Crescimento que o senador Sérgio Guerra do PSDB disse, em entrevista à Veja, ser desnecessário.

JABOR — Simples: o Judiciário paralítico entoca todos os crimes na Fortaleza da lentidão e da impunidade. Só daqui a dois anos serão julgados os indiciados - nos comunica o STF. Os delitos são esquecidos, empacotados, prescrevem. A Lei protege os crimes e regulamenta a própria desmoralização. Jornalistas e formadores de opinião sentem-se inúteis, pois a indignação ficou supérflua. O que dizemos não se escreve, o que escrevemos não se finca, tudo quebra diante do poder da mentira desse governo.

Coitados dos formadores de opinião! Quem está se fazendo de vítima do mundo agora é o nosso ilustre autor. É a maldição do espelho. Você só enxerga no outro aquilo que você é.

Esse argumento chega às margens do delírio... Um devaneio que parte da premissa, completamente falsa, de que os argumentos favoráveis ao governo encontram um espaço maior na mídia do que os contrários à ele. Como se o governo conseguisse atingir a população de maneira mais constante e regular do que a mídia que o ataca diariamente. Se o que vocês escrevem não se finca talvez as pessoas discordem de algumas dessas opiniões. Ou hipóteses, no caso de Ali Kamel. Mas admitir isso seria pedir demais aos donos da verdade.

Não foi um desses formadores de opinião que no exercício do legítimo direito de liberdade de expressão publicou matéria na Folha de São Paulo alertando Daniel Dantas sobre a operação da Polícia Federal que o investigava? Não foram os jornais que optaram por desviar a atenção do leitor para uma discussão inócua sobre a necessidade do uso de algemas ao invés de focar na abrangência do esquema de Dantas, que conseguiu dois habeas corpus em menos de 48 horas do ilustre Presidente do Supremo Gilmar Mendes? Onde está toda a indignação! Quem está protegendo quem? O que o nobre cineasta ainda não percebeu é que as pessoas estão reivindicando o direito de lembrar e esquecer que deixou de pertencer somente aos grandes conglomerados da comunicação. E isso eles não aceitam. Tanto que quando a Petrobrás decidiu colocar no ar o seu blog para abrir um canal direto de comunicação com o público eles trouxeram um antropólogo para declarar no jornal que aquilo era uma forma de terrorismo de Estado! A comunicação deles é liberdade mas a dos outros é terrorismo. Que vergonha! Quem é mesmo que não enxerga o outro e mente de maneira compulsiva?

JABOR — Sei que este é um artigo óbvio, repetitivo, inútil, mas tem de ser escrito...
Está havendo uma desmoralização do pensamento. Deprimo-me: Denunciar para quê, se indignar com quê? Fazer o quê?'
A existência dessa estirpe de mentirosos está dissolvendo a nossa língua. Este neocinismo está a desmoralizar as palavras, os raciocínios. A língua portuguesa, os textos nos jornais, nos blogs, na TV, rádio, tudo fica ridículo diante da ditadura do lulo-petismo. A cada cassado perdoado, a cada negação do óbvio, a cada testemunha, muda, aumenta a sensação de que as idéias não correspondem mais aos fatos!!!!!


Concordo plenamente! Chamar o período militar de dita branda, como o fez o Jornal Folha de São Paulo, e o governo Lula de ditadura, como o faz o nobre cineasta, apenas comprova como as idéias divulgadas pela mídia conservadora não correspondem aos fatos. E olha que o Lula nem tentou mudar a legislação para garantir um terceiro mandato. Quem fez isto — mudar legislação para se manter no poder — foi o Fernando Henrique Cardoso e ninguém chama ele de ditador tucano por isso. Não me causa espanto que Arnaldo Jabor utilize o verbo impor-se junto à palavra verdade. Os donos da verdade simplesmente não toleram a diversidade de opinião e reagem a toda e qualquer tentativa de pluralizar o discurso público desqualificando-as como atentado à liberdade de imprensa.

JABOR — Pior: que os fatos não são nada - só valem as versões, as manipulações.

Fatos? Quem se importa com os fatos na grande imprensa? Ali Kamel, editor de jornalismo da Globo, já declarou publicamente que a função dele como diretor de jornalismo é a de testar hipóteses. Diogo Mainardi foi condenado por injúria e difamação. Ontem mesmo li uma reportagem de como um jornalista de O Globo usou a resposta dada por Aluizio Mercadante a uma pergunta sobre o resultado das eleições para governador de 2006 como resposta à uma outra pergunta sobre o dossiê dos aloprados. O que aconteceu com o relato imparcial dos acontecimentos? O cineasta parece sugerir que fato é somente aquilo em que ele acredita, assim como versão é aquilo em que acreditam seus opositores. Independentemente dos fatos.

JABOR — No último ano, tivemos um único momento de verdade, louca, operística, grotesca, mas maravilhosa, quando o Roberto Jefferson abriu a cortina do país e deixou-nos ver os intestinos de nossa política. Depois surgiram dois grandes documentos históricos: o relatório da CPI dos Correios e o parecer do procurador-geral da república. São verdades cristalinas, com sol a Pino. E, no entanto, chegam a ter um sabor quase de gafe. Lulo-Petistas clamam: Como é que a Procuradoria Geral, nomeada pelo Lula, tem o desplante de ser tão clara! Como que o Osmar Serraglio pode ser tão explícito, e como o Delcídio Amaral não mentiu em nome do PT ? Como ousaram ser honestos? Sempre que a verdade eclode, reagem.

E quando a verdade não chega nem a eclodir o que acontece? Será que as pessoas ficam menos burras? Menos indignadas? Menos ignorantes? Será que a corrupção diminui? Será que já nos esquecemos do Procurador Geral da República Geraldo Brindeiro que ficou carinhosamente conhecido como engavetador geral da República quando serviu junto a FHC? E o mensalão do Sérgio Motta que garantiu os votos no Congresso para a aprovação da emenda que mudava a Constituição tornando legal o dispositivo da reeleição? Imagine se Lula tentasse mudar a Constituição da mesma forma! Quantos não o acusariam de ditador! Quantos não defenderiam idéias golpistas assim como fizeram durante a crise de Honduras? Mas o FHC pode! E tudo é vendido de maneira muito civilizada num pacotinho DeLuxe como necessário e fundamental para o bem de todos e felicidade geral da nação. Digam ao povo que fico! Salve, salve o charme e o bom gosto pragmático dos tucanos como costuma “eulogizar” Arnaldo Jabor em seus devaneios e sofismos alexandrinos. A compra de votos, nesse contexto, teria sido menos indigna? Mais aceitável? Menos corrupta pois foi feita pelos digníssimos doutores que apoiam um sociólogo formado em Paris e não pelos aloprados que seguem um metalúrgico sindicalista de Garanhuns? Isso sim é de um levianismo e desonestidade intelectual ímpares que depõem contra a noção de ética de seus porta-vozes. Promover o esquecimento da herança tucana é uma leviandade tão grave quanto seria não expor os problemas do governo Lula. É nessa contradição que se afunda a retórica moralista da imprensa conservadora quando tentam imputar exclusivamente a membros do PT a culpa pela prática, totalmente repreensível, de compra de votos de parlamentares. Pergunte-se por que os dois pesos e as duas medidas e estaremos mais próximos de um país melhor. Pergunte-se qual a diferença entre a corrupção modernizadora tucana e a corrupção ideológica petista.

JABOR — Quando um juiz condena rápido, é chamado de exibicionista'. Quando apareceu aquela grana toda no Maranhão (lembram, filhinhos?), a família Sarney reagiu ofendida com a falta de 'finesse' do governo de FH, que não teve a delicadeza de avisar que a polícia estava chegando....

Mas agora é diferente.

As palavras estão sendo esvaziadas de sentido. Assim como o stalinismo apagava fotos, reescrevia textos para contestar seus crimes, o governo do Lula está criando uma língua nova, uma neo-língua empobrecedora da ciência política, uma língua esquemática, dualista, maniqueísta, nos preparando para o futuro político simplista que está se consolidando no horizonte.


Pois é, durante a blitzkrieg pelo aumento dos juros, apesar dos índices registrarem queda da inflação, todos os grandes jornais noticiavam o perigo iminente de inflação a fim de justificar o aumento de juros como decisão acertada do Banco Central. A Globo chegou ao cúmulo de colocar no ar um especialista dizendo que, sim, havia o perigo de inflação por que o IPCA não tinha caído, ele tinha parado de subir! E o povo ignorante engole tudo. Mais uma vez, quem é mesmo que usa a língua para distorcer a realidade?

Essa acusação de Jabor parece descrever com mais fidelidade o comportamento da grande imprensa do que as posições do governo Lula. A entrevista de William Bonner e Fátima Bernardes com Dilma Rousseff no Jornal Nacional, por exemplo. Começam criticando a personalidade da candidata como se não tivessem nada mais importante sobre o que falar. Afirmam, então, que ela passa uma imagem dura, intolerante e que um chefe de Estado deveria estar preparado e ser capaz de fazer alianças, de negociar. Ela responde bem à provocação dizendo que para se obter resultados você, às vezes, tem que agir com mais firmeza. Então eles mudam o foco e questionam as alianças feitas pelo PT durante o governo. Ou seja, não importa o que você faça. Se você faz alianças é criticado como hipócrita e se não faz é criticado como autoritário. Isso não acrescentou nada ao eleitor. Não esclareceu nada sobre propostas da candidata. Bonner tentou apenas desqualificá-la e de maneira extremamente rude e deseducada que, usando as palavras da própria empresa, demonstra “um comportamento incompatível com a posição que ocupa” como editor do Jornal Nacional. Aqui no Brasil, se você quer realmente que a imprensa cumpra o seu papel social deve votar nos candidatos que ela não apoia.

JABOR — Toda a complexidade rica do país será transformada em uma massa de palavras de ordem, de preconceitos ideológicos movidos a dualismos e oposições, como tendem a fazer o Populismo e o simplismo.

Melhor exemplo de que você só acusa o outro daquilo que é capaz de perceber em si mesmo. E Jabor acusa seus antagonistas do erro que ele mesmo comete ao caracterizar o governo Lula como populista. Nada mais simplista e reducionista! O caráter pejorativo frequentemente associado ao uso da palavra populismo não somente expõe uma certa arrogância intelectual como é um paradoxo ideológico por si só. Se a democracia é o sistema onde a maioria decide os rumos que uma sociedade deve seguir, o governante teria que necessariamente acatar ou orientar suas escolhas tendo por base o desejo do povo expresso nas urnas. Processo semelhante de desqualificação aconteceu com a expressão Terceiro Mundo que ao longo do tempo adquiriu sentido pejorativo virando sinônimo de pobreza mas que na verdade surgiu como designação de uma iniciativa multilateral que ficou conhecida como o movimento dos países não alinhados que foi uma resposta à bipolarização que dominou as relações internacionais do pós guerra. Por que haveria de se condenar ou desqualificar alguém que supostamente estaria agindo em benefício do povo que o colocou no poder? Aqueles que, com frequência, usam esse tipo de palavra de ordem visam única e exclusivamente desqualificar governos populares e são, coincidentemente, avessos à políticas públicas democráticas de transferência de renda e defensores do receituário neo-liberal que já deu provas mais do que suficientes de que a idéia da auto-regulamentação dos mercados nada mais é do que um modelo teórico de caráter utópico e dogmático. A defesa de soluções neo liberais pós crise de 2008 é análoga em incoerência à defesa do comunismo histórico depois da queda do muro de Berlim. Na verdade nos últimos anos a imprensa tem se mostrado como um instrumento muito mais comprometido com seus próprios interesses do que com sua função de fomentar de maneira isenta o processo de formação de opinião da sociedade.

Dizer que nada mudou, isso sim é repetir preconceitos ideológicos perpretados por uma mídia conservadora incapaz de aceitar que o Brasil vai muito além dos limites da ponte aérea Oscar Freire–Garcia D’Ávila. Além do mais, o setor bancário, geralmente dissociado do universo semântico da palavra povo, nunca registrou tanto crescimento quanto durante o governo Lula.

JABOR — Lula será eleito por uma oposição mecânica entre ricos e pobres, dividindo o país em 'a favor' do povo e 'contra', recauchutando significados que não dão mais conta da circularidade do mundo atual. Teremos o 'sim' e o 'não', teremos a depressão da razão de um lado e a psicopatia política de outro, teremos a volta da oposição Mundo x Brasil, nacional x internacional e um voluntarismo que legitima o governo de um Lula 2 e um Garotinho depois. Alguns otimistas dizem: Não... este maremoto de mentiras nos dará uma fome de Verdades!

Pois é ricos e pobres são conceitos relativos e ultrapassados que não tem nada a ver com política e com a nova ordem mundial que de circular não tem absolutamente nada. São rótulos apenas, nada mais, desvinculados de interesses, de praxis e de maneiras próprias de ver e se relacionar com o mundo. Isso sim seria uma manipulação linguística empobrecedora da ciência política. Nada mais longe da verdade da qual o nosso autor parece sentir tanta falta.

De fato, são as políticas de redistribuição de renda, ferozmente criticadas como assistencialismo e empreguismo, que são dotadas, elas sim, de enorme circularidade e inclusive se enquadrariam dentro de um conceito mais amplo muito na moda hoje em dia que é o da sustentabilidade. Essas políticas se opõem diametralmente às já conhecidas “vamos fazer o bolo crescer primeiro para depois dividir” popularizadas como “trickle down economics” nos anos 80 e início dos noventa durante o apogeu do Consenso de Washington quando proclamava-se o fim da história: outra falácia empobrecedora da ciência política. Mas como diz a sabedoria popular: só acaba quando termina. E estamos ainda muito longe do fim. Seria completamente insustentável permitir que uma economia como a nossa continuasse a manter metade da população brasileira vivendo com menos de um dólar por dia como acontecia há alguns anos.

Desde 2006, quando esse artigo foi escrito por Arnaldo Jabor, o PSDB vem se mostrando cada vez mais ineficiente em seus métodos de fazer oposição ao PT. Primeiro, por que simplesmente compactua com muitas das posições do governo Lula realmente passíveis de crítica como a complacência com o setor bancário, política de juros e aumento da participação de capital especulativo e financeiro na economia. E segundo, por que, imaturamente, se posiciona contra iniciativas que produzem resultados cujo impacto pode ser facilmente percebido pelo eleitor como o PAC e os programas sociais de redistribuição de renda. E aí está um dos maiores legados que Lula deixou para a história política do Brasil: a necessidade de um redirecionamento da oposição.

Até a eleição de Lula em 2002, o debate político se dava ainda embalado por uma versão pop da antiga Política dos Governadores da República Velha, onde representantes das diversas oligarquias regionais se revezavam no poder sem divergir significativamente sobre os rumos que o país deveria seguir. A continuidade era a tônica. O sucesso e a popularidade de Lula estão forçando uma renovação da política brasileira que não mais irá permitir que representantes desses interesses oligárquicos debatam entre si o futuro do país. Apesar de, ao longo de seu governo, Lula ter optado por se aproximar de alguns de seus históricos adversários como o clã Sarney, é possível dizer que a complexidade rica do nosso país, aparentemente tão valorizada pelo cineasta, finalmente debutou em sua dimensão política executiva de onde havia sido mantida como mera observadora desde o grito do Ipiranga. A oposição será obrigada a se renovar se quiser se manter politicamente viável. A presença de Marina Silva e Plínio Arruda nessa campanha são a maior prova desse processo; e o significativo esvaziamento do discurso de oposição do PSDB e do DEM, um sinal da perplexidade desses setores diante da necessidade iminente de se adaptarem aos novos tempos.

Os elevados índices de popularidade de Lula não se devem a uma população ignorante como gostam de dizer os bufões da mídia conservadora mas sim ao fato de pessoas comuns serem capazes de perceber de maneira muito empírica como suas vidas melhoraram e como escolhas tomadas pelo governo produziram efeitos positivos tangíveis no seu dia a dia. Não precisam de IPCA’s, PIB’s ou análises aprofundadas de qualquer indicador macroeconômico para isso. Basta ver no final do mês como o poder de compra do salário aumentou, como foram capazes de comprar um carro, adquirir casa própria, conseguir um emprego, estudar ou ter acesso a bens de consumo com os quais nem sequer ousavam sonhar. Não se pode nem argumentar que essas pessoas sejam vítimas de propaganda, como no caso dos Estados Unidos, visto que a grande mídia raramente concorda com as posições do governo. Se existe um efeito de propaganda, este, definitivamente, não se manifesta em opiniões favoráveis ao governo Lula. A divulgação, em 2010, de uma polêmica criada pela censura desnecessária de um texto fácil e factualmente contestável de um cineasta brasileiro durante a campanha de 2006 vem apenas corroborar essa tese. Partidos como PSDB e PFL(DEM), diante dos resultados do governo Lula, se encontram à beira do ostracismo pois insistem em representar forças políticas já em estado avançado de decomposição. O que explica o esforço do PFL em mudar de nome e passar a se chamar — ironias do destino — Democratas tentando tirar vantagem política da onda da Obamamania.

Psicopatia política é, na verdade, fazer malabarismos retóricos e contorcionismos intelectuais hiperbólicos com o simples propósito de negar os avanços tácitos conseguidos nesses últimos 8 anos. Depressão da razão é repetir inconscientemente o mantra de que nada mudou. Por isso encaminho o link do documento que o ministro Guido Mantega disponibilizou recentemente no site do Ministério da Fazenda sobre o desenvolvimento da economia brasileira nos últimos anos. Veja com os seus próprios olhos e tire suas conclusões. Ao se entender como e quanto mudou talvez possa se ter uma idéia do porquê algumas pessoas insistem em afirmar o contrário.