quinta-feira, 18 de julho de 2013

Tulherias Bossa Nova
Le 17 Juillet de l’anné 457 dans la mort du évêque Sardinha

Capítulo I – O céu não está para Peixes
Saí de casa tarde. Já era quase oito da noite. O ato em frente ao apartamento do Governador, Sérgio Cabral, no Leblon, havia sido marcado para as cinco e meia da tarde. Absurda falta de planejamento. Afinal de contas, era bem sabido que Mercúrio, o planeta que rege transportes e comunicação, está retrógrado até o dia 20 desse mês.

Em astrologia, quando um planeta “anda para trás”, ele enfraquece, e não canaliza a sua energia de forma plena sobre as áreas de nossas vidas por ele regidas. Isso significa que a possibilidade de atrasos por conta de problemas no trânsito ou por conta de problemas mecânicos seriam bem prováveis. Mesmo assim, desafiei as estrelas e optei por ficar em casa até um pouco mais tarde escrevendo e acompanhando os acontecimentos pela rede.

Lá pelas sete e pouco, resolvi ir pra rua. Me armei com as armas de Jorge: uma câmera digital cuja bateria sempre me deixa na mão; o celular; uma caneta; e o bloquinho de anotações que guarda os registros da noite em frente ao Copacabana Palace, mas que ainda contava com folhas em branco suficientes para mais uma noite que tinha tudo para bombar. Fiz o check list duas vezes porque Mercúrio retrógrado também faz você esquecer as coisas, e parti para enfrentar o dragão que solta pimenta pelo nariz.

A dúvida era se seguiria pelo Jardim Botânico ou se tentaria chegar ao Leblon por Ipanema. Sabia que devido à Mercúrio, ao adiantado da hora e à manifestação, o trânsito nas proximidades estaria caótico. Deixei o acaso decidir e peguei o primeiro ônibus que me conduzisse a meu destino. Qual não foi minha surpresa quando, de cara, apareceu o 583. Quem conhece a peça sabe como costuma demorar! E segui pelo Jardim Botânico.

Era um ônibus de ar condicionado. Sempre me pergunto por que parece que os ônibus de ar condicionado circulam mais quando está frio ou quando está chovendo. De onde me sentei dava para ver a tela de televisão que entretem a viagem dos passageiros com um sarapatel de notícias, irrelevâncias sobre celebridades, programação cultural de teatro, vídeos de bichinhos fofos e conselhos astrológicos. A viagem seguia lenta já na entrada da São Clemente e eu me distraía entre a tela de dentro e a tela de fora.

Quando passávamos em frente ao Santo Inácio apareceu pela primeira vez a tela azul das dicas astrológicas onde se lia: Urano retoma movimento direto em Áries… Estava distraído. Não dei muita atenção e nem lembro a que signo se referia. O trânsito continuava lento. A cidade passava na janela e parecia seguir sua rotina normal de quarta feira.

Chegávamos no Largo dos Leões, também signo de fogo, quando olhei para dentro de novo e me deparei com a mesma tela de astrologia dizendo: Urano retoma movimento direto em Áries… Foi aí que a coisa me chamou a atenção. Apesar de distraído pela viagem, sabia que não havia passado tempo suficiente para que a programação tivesse corrido por todos os signos do zodíaco e estivesse de volta àquele signo. Mercúrio mostrava, assim como o gigante, que não estava adormecido. Alguma coisa não estava funcionando direito no sistema que alimenta o conteúdo astrológico e ele simplesmente ficava repetindo aquela mesma tela dizendo Urano retoma movimento direto em áries…

Para os não iniciados, Urano é o planeta revolucionário, aquele que quebra as regras estabelecidas pelo velho Saturno. Se relaciona com ideais de liberdade, independência e inovação. Rege os aquarianos e é responsável pela famosa intuição aquariana. Áries é o primeiro signo do zodíaco, o mais individualista, o mais impulsivo, o mais agressivo. Vem depois do sensível e universalista signo de Peixes e é regido por Marte, o planeta vermelho e Deus da guerra para os romanos. Para complicar a situação, Mercúrio está retrógrado dificultando a comunicação. O céu mandava sua mensagem.

Nenhum comentário:

Postar um comentário